Assinatura de documentos eletrônicos na era dos aplicativos

Sociedade ainda não sabe aproveitar a facilidade que está à sua disposição

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Em um mundo virtual e globalizado, com centenas de aplicativos sendo lançados todos os dias, temos lidado com maior frequência com a aceitação e respectiva assinatura de documentos eletrônicos, sendo que a maior parte das pessoas sequer percebe a seriedade de tal situação e as suas implicações no mundo jurídico quando realizados ou não de acordo com a legislação.

Apesar de desconhecido pela maior parte da população brasileira, o Brasil tem regulamentado em sua legislação os documentos eletrônicos e as respectivas assinaturas eletrônicas, garantindo total validade e segurança jurídica dos documentos assinados através da rede mundial de computadores.

Assim, os documentos eletrônicos assinados pelo meio eletrônico são seguros e válidos no Brasil, tal como os físicos, não havendo vedações à sua utilização, desde que utilizados adequadamente.

Patricia Pinheiroi bem destaca que a problemática da substituição dos documentos em papel pelo digital é apenas uma questão mais cultural do que jurídica, tendo em vista que o Código Civil (2002) prevê até mesmo a realização de atos orais – tal como no artigo 656 – e determina a realização da manifestação de vontade expressa por qualquer meio (artigo 107).

Apenas a título de esclarecimento inicial e melhor definição, vale destacar que Leonardo Parentoniii define: como documento eletrônico “o texto escrito que representa um fato e tem como suporte material uma mídia eletrônica”; como assinatura eletrônica “qualquer mecanismo utilizado para identificar um sujeito em meio eletrônico”; e, por fim, como assinatura digital: a “técnica mais complexa que permite auferir, com precisão, a autenticidade e integridade de um documento”.

A assinatura eletrônica é um gênero do qual a assinatura digital é uma espécie, sendo que tal espécie é uma forma mais complexa e elaborada, utilizada para proteger a mensagem digital através de codificações por meio de algoritmos de criptografia. De qualquer forma, a assinatura eletrônica também tem validade jurídica, conforme será melhor aprofundado a seguir.

Acerca das legislações que permitem a validade e a segurança jurídica, a Medida Provisória 2.200-2/2001 instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) com a finalidade de garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos de forma eletrônica; entretanto, tal Medida Provisória não vedou a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de outros documentos em forma eletrônica, conforme disposto no parágrafo segundo do artigo dez:

§ 2o O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.

Dessa forma, a legislação brasileira permitiu outros meios de comprovação da integridade e da autoria de documentos eletrônicos, desde que aceitos pelas partes envolvidas. O prof. Carlos Alberto Rorhmanniii destaca que a Medida Provisória em comento permite até mesmo simples assinaturas eletrônicas, tais como senhas que sejam de conhecimento das partes, para acesso ao documento, não sendo obrigatória a utilização das assinaturas digitais e certificações emitidas por Autoridades Certificadoras credenciadas pela ICP-Brasil.

O Código Civil (2002) em seus artigos 104 e 212 dispõe, respectivamente, tão somente sobre os requisitos para a validade do negócio jurídico – agente capaz; objeto lícito, possível determinado ou indeterminável; forma prescrita ou não defesa em lei – e o seu meio de prova – confissão; documento; testemunha; presunção; perícia – não havendo qualquer tipo de vedação aos documentos eletrônicos.

Nesse sentido, o artigo 411 do Código de Processo Civil (2015) complementa a temática, considerando como autêntico o documento quando “a autoria estiver identificada por qualquer outro meio legal de certificação, inclusive eletrônico, nos termos da lei”, havendo ainda uma seção na referida legislação regulamentando a utilização e admissão de documentos eletrônicos entre os artigos 439 e 441.

O enunciado 297 do Conselho de Justiça Federal também é claro acerca da discussão em comento, definindo que o documento eletrônico tem valor de prova, desde que seja apto a conservar a integridade do seu conteúdo e idôneo ao apontar a sua autoria, qualquer que seja a tecnologia empregada para a sua elaboração.

Há, portanto, a regulamentação da temática e a permissão para utilização com validade e segurança jurídica dos documentos eletrônicos e das assinaturas eletrônicas, bastando apenas que as partes envolvidas as utilizem de acordo com o que dispõe a legislação brasileira.

Na era dos softwares aplicativos, também conhecidos tão somente como “aplicativos” ou “apps” essa realidade de assinaturas de documentos eletrônicos passa a ser não só uma facilidade para as partes envolvidas, mas uma necessidade de agilidade e facilitação no atual cenário virtual desses aplicativos.

No cenário ora descrito os aplicativos precisam de uma forma menos burocrática e mais ágil, de acordo com os processos facilitadores propostos pelos aplicativos, para permitir o aceite dos documentos eletrônicos propostos e permitir segurança às partes envolvidas.

Assim, surge a necessidade de entender melhor as assinaturas eletrônicas e a forma de se permitir a sua realização por formas alternativas, que viabilizem segurança, validade e agilidade na era dos aplicativos.

Conforme Sheila Lealiv, para serem válidos, os documentos eletrônicos a serem aceitos através de assinatura eletrônica devem ser: confidenciais, íntegros, não repudiáveis e autênticos.

  1. Confidenciais: devem permitir a confidencialidade dos dados convencionados, assegurando privacidade e segurança de que não serão utilizados com finalidade diversa da avençada.

  2. Íntegros: devem conter qualidades que não permitam a sua alteração, modificação ou fraude sem que ao realizar tais ações deixem rastros, permitindo a preservação adequada do documento. Deve-se assegurar que o documento não foi alterado ou adulterado de modo a fraudá-lo. A forma mais utilizada é a tranca eletrônica através de uma função hash; um cálculo matemático que utiliza criptografia vinculada ao documento eletrônico.

  3. Não repudiáveis: as partes envolvidas devem concordar com a realização da assinatura eletrônica do documento em forma eletrônica através do meio acordado, não podendo repudiá-lo posteriormente.

  4. Autênticos: assegurando a segura identificação das partes envolvidas e que garanta a origem das mensagens eletrônicas trocadas. Não deve ser possível a adulteração do meio utilizado, bem como deve ser possível a efetiva identificação das partes envolvidas e de suas vontades registradas.

Acerca da autenticidade, temos que complementar que ela se dará através do contexto e do registro de informações no documento.

Tal como um documento assinado em papel contém todo o acordado, o nome, a assinatura manuscrita e rubricas de quem o assina, complementado pela verificação de outros meios de autenticação, como por exemplo a apresentação de um documento de identidade, de um comprovante de residência ou até mesmo a autenticação mediante reconhecimento de firma em cartório, o documento eletrônico assinado de forma eletrônica também tem os seus fatores de autenticação.

Em suma, conforme Emiliano Monteiro e Maria Eloisa Mignoniv, podemos citar como fatores de autenticação do documento eletrônico:

  1. O que o usuário tem: documento de identificação, token, telefone celular, firma registrada em cartório, dentre outros;

  2. O que o usuário é: impressão digital (biometria), reconhecimento de face ou de retina, padrão de voz, dentre outros;

  3. O que o usuário sabe: assinatura manuscrita, senha ou frase de segurança registrada e convencionada entre as partes, dados pessoais;

  4. Quando: a data e hora da realização do aceite e respectiva assinatura eletrônica para serem conhecidas e verificadas;

  5. Onde o usuário está: a posição geográfica do usuário no momento de realização da assinatura eletrônica, que poderá ser verificada através de um dispositivo de Global Positioning System (GPS), por exemplo.

Usualmente são utilizadas combinações de dois ou mais métodos de autenticação a fim de que a segurança sobre a assinatura eletrônica seja elevada e sejam evitadas fraudes.

Diante do exposto, o que nos resta entender é que o cenário atual precisa de novos meios seguros e válidos para a realização de assinaturas de documentos eletrônicos, de modo que facilitem o dia a dia dos usuários da Rede Mundial de Computadores e que permitam maior celeridade e menor burocratização dos processos realizados no meio virtual ao qual estão inseridos os aplicativos.

E, nesse contexto, o meio jurídico tem evoluído constantemente, já aceitando diversas das tecnologias disponibilizadas e que se adequam à autenticação para validação jurídica e adequada das assinaturas eletrônicas de documentos realizados no meio eletrônico, tanto no modelofriendly, quanto no modelo take it or leave it, bastando que as partes se mantenham atualizadas de modo a agirem de acordo com o que a legislação permite, atuando com segurança e com a tranquilidade de que os documentos eletrônicos assinados serão válidos, ainda que não burocráticos.

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i PINHEIRO, Patricia Peck. Direito digital. 6. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

ii PARENTONI, Leonardo Netto. Documento Eletrônico. Curitiba: Juruá, 2007.

iii ROHRMANN, Carlos Alberto. Curso de Direito Virtual. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.

iv LEAL, Sheila do Rocio Cercal Santos. Contratos eletrônicos: validade jurídica dos contratos via internet. 1. Ed. São Paulo: Atlas, 2009.

v MONTEIRO, Emiliano Soares; MIGNONI, Maria Eloisa. Certificados digitais: conceitos e práticas. Rio de Janeiro: Brasport, 2007

JOTA