Tomamos conhecimento da publicação “Estranhas Coincidências” que é chamada de capa da edição nº 1085 da Revista Carta Capital. Assinada pelo jornalista André Barrocal, a reportagem pode ser lida da página 24 a página 27.
Fiel ao compromisso de fazer sua opinião ser percebida em todos os momentos por ela vivenciados na Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), a AARB mais uma vez pretende tecer suas considerações sobre o conteúdo da reportagem, respeitando, sempre, a pluralidade das opiniões que é o melhor dos sinais de qualquer nação que se considere democrática.
Importa trazer à baila a verdade sobre o debate acerca da possibilidade de emissão de certificados digitais por meio virtual. A história, sempre ela, é a melhor via para tal.
A ICP-Brasil tem sua existência assegurada pela Medida Provisória 2.200-2, de 24 de agosto de 2001. O digito 2, ao final de sua numeração legal, é símbolo dos tempos em que o Poder Executivo extrapolava da sua função atípica de legislar já que estamos a falar de uma Medida Provisória em sua segunda versão; na primeira, não havia previsão para identificação presencial, o que demonstra que todo assunto deveria ser tratado em observância ao que diz a lei do eterno retorno.
Consagrou-se a emissão de certificados digitais na ICP-Brasil sempre na presença dos seus requerentes, fossem pessoas ou empresas, e que o Agente de Registro seria a interface humana para recepcionar, conferir documentos, encaminhar requisições às Autoridades Certificadoras e, por fim, entregar aos titulares os respectivos certificados.
Para termos uma ideia, em 25 de agosto de 2015, o Comitê Gestor da ICP-Brasil reuniu-se para deliberar sobre proposta de fim de renovação online não presencial de certificados de Pessoa Jurídica. O item foi aprovado e a ata desta reunião pode ser verificada aqui.
Em maio de 2019, exatamente no dia 14, a AARB foi convidada para reunião em que foram expostos os temas do então próximo encontro do Comitê Gestor. Na pauta, de novo, a renovação online de certificados digitais, para o que fomos contrários. Recentemente, o tema retornou ao Comitê Gestor e, dessa vez, foi aprovado.
Outro aspecto importante a ser considerado é o de que a AARB não foi procurada pela Carta Capital. Portanto, não demos entrevista para a revista. É bastante provável que a fala a nós atribuída tenha sido, lícita e democraticamente, extraída das considerações do voto por nós proferido e publicado aqui.
Incomoda, pessoal e profissionalmente, que o trabalho do Comitê Gestor da ICP-Brasil receba tanta luz midiática por conta de suspeitas e ilações que podem fazer sentido, mas não comprovam minimamente qualquer verdade. Aliás, aprendi a muito custo que não se defende a verdade com mentiras e esta é uma máxima da qual jamais abrirei mão.
A matéria alega:
– A disseminação dos RGs digitais embute riscos que podem ser vistos em uma operação de outubro de 2016 da Polícia Federal, batizada de Demara. A PF desbaratou em Pernambuco uma quadrilha expert em sacava indevidamente dinheiro do FGTS. A turma falsificava os documentos pessoais dos sócios de uma empresa e o contrato social dela, daí conseguia arranjar um certificado digital com o nome dessa firma. De posse dele, a quadrilha cadastrava a empresa no sistema do FGTS da Caixa e informava uma demissão fajuta. O trabalhador supostamente demitido existia mesmo e era aliciado para ir até o banco pegar seu imerecido fundo de garantia, em troca de uma parte da grana. Os golpistas tinham planos de obter 3 milhões de reais quando foram presos. –
Se repararmos bem no descrito acima, o que causou prejuízo ao erário não foi a certificação digital, mas sim o falido sistema de identificação civil que temos no País. A ICP-Brasil não pode ser taxada de sistema de identificação frágil pelo fato de alguém, que compra espelhos quentes vendidos por maus servidores públicos, ter conseguido emitir um certificado digital nessas condições. O problema da identificação civil no Brasil é grave e já tratamos do tema em outra oportunidade – leia em Por que a validação presencial é importante para emissão do certificado digital ICP-Brasil?
Os benefícios por este setor produzidos ao Brasil são imensos, o que também já retratamos em Considerações acerca da publicação da Folha de S.Paulo.
A certificação digital ICP-Brasil seguirá, por sua natureza e por sua vocação, a ser um importante instrumento de desburocratização do País, reduzindo o custo-empresa, evitando o desperdício de caros insumos e garantindo cidadania digital para todos os brasileiros e brasileiras titulares de certificados digitais.
Edmar Araújo
presidente-executivo da Associação das Autoridades de Registro do Brasil (AARB)