Parte deverá digitalizar processo para recorrer em SP

Por Laura Ignacio | De São Paulo

As partes que ainda possuem processos em papel no Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região (SP e MS) terão que arcar com o custo de digitalização dos recursos em andamento. A exigência está na Resolução nº 142, baixada pela desembargadora federal Cecília Maria Piedra Marcondes, presidente do tribunal. Se a norma for descumprida, o processo não terá seguimento na Corte. A medida entrou em vigor em outubro, exceto em relação aos processos relacionados à advocacia pública. Para eles, a resolução entra em vigor em janeiro. Diante da obrigação, advogados privados e públicos já contestam a medida. As seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) paulista e do Mato Grosso do Sul pediram ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que a medida seja revogada e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) da 3ª Região apelou para o Judiciário. O CNJ negou o pedido de liminar das OABs. A Justiça ainda não julgou o mandado de segurança impetrado pela PGFN. De acordo com o artigo 3º da resolução, quem propuser recurso de apelação deverá promover a virtualização do processo para a sua remessa ao tribunal. Dados do TRF mostram que hoje há quase 200 mil processos eletrônicos em trâmite, mas ainda existe um estoque superior a 1 milhão em papel. Por isso, segundo o juiz auxiliar da presidência Fabiano Carraro, foi instituída a Resolução 142. “Cada folha digitalizada custaria ao tribunal R$ 0,07. Considerando que cada processo tem, em média, 200 folhas e o total de processos em papel seriam necessários R$ 14 milhões para tudo ser virtual”, afirma. Segundo Carraro, a resolução é uma medida de gestão para que o tribunal consiga acelerar a implementação do processo eletrônico “sob pena de ficarmos anos em um sistema híbrido que não interessa a ninguém”.

O magistrado lembra que a digitalização elimina o tempo de tramitação do processo de um escaninho para outro, economiza papel e reduz custos do tribunal com espaço físico para armazenamento. “Há relatos de processos digitais com sentença final em apenas 23 dias”. Para a presidência do TRF, existe uma incompreensão por parte de alguns atores. Carraro afirma que a medida será positiva inclusive para os advogados que não precisarão mais ir até o fórum. A presidência justifica a divisão do ônus porque seu objetivo é promover o bem comum e o Código de Processo Civil (CPC) estimula a cooperação entre partes e Judiciário. “Me parece resistência ao novo porque a norma não traz ônus desarrazoado a quem quer que seja”, afirma o juiz. A norma original entraria em vigor em agosto deste ano, mas após reuniões com a advocacia já foram implementadas algumas mudanças pelas Resoluções nº 148 e 152. O prazo de início de vigência foi prorrogado, o TRF deixou de exigir a digitalização se o processo tiver mais de mil folhas, e passou a assegurar a disponibilização gratuita de scanners. Se o equipamento faltar ou estiver quebrado, o andamento poderá permanecer no meio físico.

Mesmo após as alterações no texto, as OABs e a PGFN da 3ª Região contestam a norma. “Entendemos que o Poder Judiciário já é custeado por uma taxa específica paga pelo jurisdicionado”, diz Leonardo de Menezes Curty, procurador-regional da Fazenda Nacional na 3ª Região. “A Constituição Federal manda que o Poder Judiciário resolva os conflitos entre cidadão e União”, afirma. O procurador ressalta também que, segundo o CPC, um processo só será arquivado ou suspenso em situações específicas. “O TRF inventou essa hipótese da digitalização. O princípio da colaboração não pode justificar qualquer tipo de medida”, diz. Os argumentos da advocacia privada são parecidos. Segundo o advogado Marcelo Knopfelmacher, presidente da Comissão de Relacionamento com o TRF-3 da OAB-SP, a resolução é ilegal ao transferir às partes um ônus que deveria ser do Judiciário. “Mais do que o ônus financeiro há a responsabilidade dos advogados porque se a parte não digitaliza o processo, ele fica congelado. Além disso, quem passou a arcar com o risco de uma digitalização incompleta é o advogado”, diz. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) eliminou o papel e se tornou o primeiro tribunal nacional totalmente virtualizado, em 2010. Com a ajuda de deficientes auditivos, a Corte escaneou todo o estoque de processos – cerca de 300 mil, com mais de três milhões de folhas.

Valor Econômico