O acesso no Brasil está abaixo da média em comparação com EUA, Europa e mesmo vizinhos como Argentina, Chile e Uruguai
Editorial Econômico, O Estado de S. Paulo
Um dos principais efeitos da crise sanitária foi acelerar, ainda que traumaticamente, a digitalização das atividades públicas e privadas. Na esfera pública, o ganho mais esperado é a desburocratização proposta pela Lei 13.874/19. O Decreto 10.278/20 estabelece parâmetros para que os documentos eletrônicos tenham o mesmo efeito prático dos documentos físicos, tornando processos corporativos mais ágeis e baratos.
Já o Decreto 10.332/20 estabelece a estratégia digital do governo para os próximos dois anos. Se bem implementada, ela deve digitalizar todos os serviços públicos; simplificar a abertura, alteração e extinção de empresas; e oferecer anais intuitivos, bancos de dados integrados, e mecanismos de avaliação dos serviços que auxiliarão gestores e cidadãos a propor políticas públicas baseadas em evidências.
No âmbito privado, a digitalização está mudando a cadeia de produção e hábitos de consumo. Na crise, enquanto muitos negócios afundam, os mais digitalizados conseguem nadar. Já aqueles baseados na rede digital surfam. Para dar uma ideia, o patrimônio do dono da Amazon, Jeff Bezos, o homem mais rico do mundo, cresceu quase US$ 30 bilhões durante a crise.
No outro extremo, contudo, o impacto da digitalização tende a aumentar a exclusão dos mais pobres. Segundo o IBGE, entre 2017 e 2018 o número de domicílios com acesso à internet no Brasil subiu de 75% para 80%, mas quase 15 milhões de domicílios ainda não têm acesso. Cerca de 98% das pessoas com formação superior acessam a internet, mas entre as pessoas sem instrução são apenas 12%.
O acesso no Brasil está abaixo da média em comparação com EUA, Europa e mesmo vizinhos como Argentina, Chile e Uruguai. Embora o Plano Nacional de Banda Larga tenha promovido melhoras desde 2010, os serviços ainda são comparativamente caros e deficientes e cobrem mal as áreas rurais e as mais pobres.
Um diagnóstico da Unesco sobre inclusão digital no Brasil recomenda, entre outras coisas, atualizar os modelos regulatórios para mudar o foco da telefonia fixa para a banda larga; integrar setores públicos e privados para suprir escolas; e aprimorar a acessibilidade para pessoas com deficiência. Além da infraestrutura, é importante que governo, empresas e academia promovam o letramento digital, em especial para trabalhadores menos qualificados.